O objetivo deste estudo é propor uma abordagem para os problemas envolvidos nas representações contemporâneas da violência urbana no Brasil, tomando a cidade do Rio de Janeiro, no final do século XX, como universo de pesquisa. Este estudo sustenta que a atual e abrangente percepção social de uma generalização da criminalidade violenta nessa cidade não começou apenas no anos 1980, mas antes, e que sua vinculação à extensão, organização e força de atração do tráfico varejista de drogas no Rio de Janeiro, exige uma melhor compreensão histórico-social das condições em que se deu a recepção à maior oferta de drogas a partir de meados dos anos 1970.
Este estudo propõe a categoria de “acumulação social da violência” com essa finalidade, discutindo três de suas dimensões: a “continuidade”, a “antiguidade” e as “metamorfoses” dos padrões de sociabilidade e de práticas criminais que constituíram, em diferentes ciclos, especialmente no mais recente, uma “cultura do medo” ou um “fantasma social”.
Ao percorrer a trajetória histórica dessa acumulação, o estudo propõe o conceito de “sujeição criminal” para diferenciar a incriminação eventual da constituição de tipos sociais de incriminados regulares, vinculados à pobreza urbana, à desnormalização do individualismo e às suas diferentes relações com a polícia. As representações desses tipos sociais distinguem-nos históricamente mas ao mesmo tempo articulam-nos, na prática, através de uma variada condensação de suas características, nas figuras do “malandro”, do “marginal” e do “vagabundo”. A relação entre a sujeição criminal e as redes de policiais que apropriam-se privadamente dos meios de incriminação, seja para a prática do extermínio, seja para a extorsão dos bandidos também passou por uma acumulação específica, que terminou produzindo uma sobreprosição de mercados ilícitos, o varejo de drogas e de “mercadorias políticas”, no ciclo mais recente. Ao final o autor propõe um modelo analítico que resume o conjunto de sua argumentação.
Malandros, marginais e vagabundos
Michel Misse
ISBN: 978 65 88791 20 2
Código de barras: 9 786588 791202
Formato: 17×24cm
Número de páginas: 416
Peso: 700g
Ano: 2022
Coedição: Faperj
Prefácio
Introdução
1. Violência, crime e corrupção: conceitos exíguos, objeto pleno
Violências
Incriminação e sujeição criminal
Da acusação social à criminação‑incriminação
Da criminalidade real à demanda de incriminação
A sujeição criminal
Condensação criminal e pobreza urbana2. A acumulação social da violência
Números e representações
A criminação no Rio de Janeiro (1942–1997)
O buraco negro da vitimização
Os “núcleos fortes” da demanda de incriminação3. Metamorfoses do fantasma
A incriminação no Rio de Janeiro
Os indiciados por enfrentamentos e violências (1950–1967)
Os condenados no Rio de Janeiro (1967–1997)
Crianças e adolescentes infratores
Os números‑representações e a questão da impunidade
Pobreza e crime
As várias aparições do fantasma4. A sujeição criminal
Assaltantes e traficantes
Duas conversões
“Bapu”: nas franjas da sujeição criminal
A acumulação social da sujeição criminal5. Malandros, marginais e vagabundos
Tradições sociais do banditismo urbano carioca
Broto e o “trama”: uma trajetória de vida6. O “movimento”: mercados ilícitos e violência
O Rio como um bazar
Mercadorias políticas e criminalização
Os mercados ilícitos no Rio de Janeiro
Dos assaltos ao tráfico: a constituição das redes (“comandos”)
O “movimento” no atacado e no varejo
Mercado informal ilegal, narcotráfico e mercadorias “políticas”7. Estruturação das redes, domínio local e sociabilidade
Metamorfoses do “movimento”
O “domínio” nos morros e favelas: reconstituição a partir da imprensa
A estruturação das redes como “comandos”
As “causas”: percepções de “Mateus”Conclusões
Fontes
Bibliografia